Por: Filipa Maló Franco
Já namoras? Quando casas? Então e filhos? Como se todos estes pontos fossem um bilhete de entrada direta para o sucesso e felicidade, e que todas as outras escolhas - em todas as diferentes áreas da nossa vida-, apenas poderão ser passageiras ou ainda mais duro, não tão importantes. E que quem ambiciona ou sente de forma diferente, se instala numa espécie de sala-de-espera, até desejar o que foi estipulado como vida "bem vivida". Esquecendo que, por vezes, essa vida "bem vivida" é repleta de vazios e desencontros dentro de nós mesmos, porque fugimos da nossa subjetividade, individualidade, escolhas e desejos, anulando-nos em prol do que a sociedade exige (como se a vida não fosse nossa!). E que com isso, nos limitemos a viver a preto e branco.
Preocupa-me, porque vivemos com a ideia de que temos todos de seguir um rumo já traçado antes de nascermos. Mesmo antes de sermos nós mesmos e antes de (e principalmente) nos encontrarmos. E acreditamos que quem não se identifica com a "norma", não pode ser feliz. Erradamente. E validamos quem se apaga em prol de uma norma coletiva e que se anula e esconde, para corresponder a um padrão e um caminho de vida "bem vivida" e "normal" - quando ela é tudo menos isso.
Já namoras? Quando casas? Então e filhos? E é então que entramos no cenário do "jantar de família" ou de antigos colegas, e as famosas (e mais temíveis!) perguntas chegam... Sem avisar, mas já esperadas. E instala-se o conflito dentro do nosso coração. E sentimos que não pertencemos a uma sociedade tão bem organizada (pensamos nós), e questionamos o que teremos de tão diferente, que nos deixa à margem dela.
Mas a meu ver, todo este problema é muito mais delicado e sensível com a questão dos filhos - tanto com as mulheres, mas sem nunca esquecer os homens, evidentemente. Toda a pressão que envolve um casal. Dor de quem quer e não pode; e de quem não quer e é julgado. Dor de quem não encontrou o momento ou a pessoa "certa". E ainda de quem está perto dos 40 e esta pergunta passa de "então e filhos?" para um calendário com um término, e todos os dias, relembram que o relógio da vida não pode ser silenciado.
“E filhos? Para quando?”
Como se a encomenda à cegonha que vem de Paris estivesse atrasada. Ignorando a questão de que por vezes, nem é só não querer ter filhos, ou não ser o momento ou prioridade, mas não ser possível (naquele momento, ou para sempre). E um não ser possível que dói e dói muito. Que mora nas noites mal dormidas. Nos pesadelos acordados. Na relação com o amor da nossa vida e claro, com o próprio, que se sente (novamente!) à margem.
E a mulher? Que ouve e lê em todo o lado sobre empoderamento feminino e gravidez e mães guerreiras como se todas as outras não o fossem. E se questiona… E eu? Por que não eu? E não se fala que empoderada e guerreira é aquela que cuida e se entrega de coração a um outro ou a uma causa. Mesmo que não o carregue no seu ventre. Que co-constrói. Porque a relação pode ter muitos sentidos.
E o homem? Que no final do dia se sente tudo menos isso. E que não mostra nem fala do que sente, porque tem de ser "forte", esquecendo que a força não se mede pela ausência de lágrimas, mas pela vulnerabilidade que nelas vive.
E preocupa-me ainda mais porque sinto que nos focamos nas perguntas erradas e preocupamo-nos em demasia com uma checklist traçada por todos, menos por nós mesmos. E que na verdade nos devíamos concentrar em escutar o outro. Respeitar as diferenças e tudo o que isso implica. E principalmente viver; seja de que forma for.
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