top of page

O que dizer quando alguém de quem gostamos e que nos é próximo não consegue ter um bebé?

  • Foto do escritor: Filipa
    Filipa
  • 22 de mai.
  • 2 min de leitura



Por Catarina Soares




Não consegue engravidar, perde gravidezes, às vezes uma atrás da outra, num banho de sangue  silencioso, triste e doloroso. As menstruações ganham outra conotação, e tudo bem que a maioria de  nós, mulheres, aprendeu desde cedo a detestar este sangue, mas aqui é diferente… é um sangue que  representa o corpo a falhar, o corpo a trair o desejo. É a prova da impotência, da vulnerabilidade.  


O que dizer quando no meio das injeções, das alterações hormonais sentidas no corpo e na alma,  das ecografias, que já nem procuram ver um bebé no ventre, mas óvulos a crescer e que às vezes  nem crescem? O que dizer a alguém que tenta viver e simultaneamente sobreviver a isto?  


O que dizer a quem, com o coração nas mãos e lagrimas nos olhos, procura ficar feliz pelos outros  que, às vezes com tanta facilidade e leveza, têm o que não conseguem ter? O que dizer a quem não  tem autorização para sentir inveja, nem raiva, nem angústia porque seria muito egoista? Que vive  nascimentos de bebés, de segundos bebés, que assiste (sempre na plateia) às gravidezes, sente nas  mãos (mas nunca no ventre) a barriga a crescer e o bebé vivo a mexer-se?  


O que dizer do vazio? Perder o que nunca foi, ou que o que quase foi?  

O que dizer a quem depois de dezenas de testes negativos precisa de continuar a acreditar no que  não existiu até então? Como não ficar obcecado? Entre testes de ovulação, testes de gravidez,  monitorização do ciclo, o que comer e beber, exercício físico… tudo para que no final nada. O que  dizer a quem vive entre a esperança e a perda ou entre a desistência e a tristeza profunda?  


O que dizer a quem não se consegue esquecer e simplesmente esperar que aconteça, porque não  acontece. O que dizer a quem já bebeu copos, foi de férias, relaxou, não pensou e mesmo assim não  engravidou?  

A infertilidade exige que façamos um caminho para dentro, para um lugar escuro e pequenino que  vive dentro de nós. Um lugar desértico, solitário e triste, tão triste.  

É como estar na plateia de várias vidas. É sentir raiva, desespero, impotência e injustiça.  

É sonhar (acordado ou a dormir) e perceber que sonhar também dói e ao mesmo tempo não  conseguir desistir de sonhar?  


O que dizer? Ou não dizer? Numa sociedade que ainda atribui valor à mulher pela sua capacidade  de gerar? Que nunca pensa que o homem existe como parte da equação e que também sente, às  vezes de forma ainda mais silenciosa e assintomática que “não é homem o suficiente”?



 
 
 

1 comentário


Parabéns por este texto e reflexão! Que as famílias que passam por esta dor, consigam fazer o seu "caminho para dentro, para um lugar escuro e pequenino que  vive dentro de nós. Um lugar desértico, solitário e triste, tão triste. " e que no fim desse caminho vejam o seu positivo o seu bebé ou caso não seja possivel que encontrem também a paz e o lugar e força e resiliência que existe. Tudo na vida passa e tudo tem solução (à excepção da morte), mesmo que não seja a que inicialmente se pensou. Que o Amor vença e que cada vez tenhamos mais forças para não querer saber do que a sociedade diz ou pensa, porque a infertilidade é u…

Curtir
Design%20sem%20nome%20(33)_edited.png
bottom of page